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O processo de inventário em Portugal tem como objetivo fazer a partilha de bens deixados pelo falecido. Nesse processo são relacionados os bens que serão divididos entre os herdeiros, bem como as pessoas que têm direito a esses bens e quantificado seus quinhões.
Ocorre que no momento em que falecem é necessário dar início ao processo de inventário e aí é que surgem inúmeras dúvidas e questionamentos sobre a herança deixada no exterior, quais os procedimentos e prazos que devem ser observados.
Com a globalização e o aumento da circulação de pessoas e bens entre os países, tornou-se bastante comum a aquisição de bens em lugares diferentes daqueles que o indivíduo habita normalmente
Para esclarecer algumas dúvidas mais comuns sobre inventário seguem algumas regras no ordenamento jurídico brasileiro e português.
Local de abertura do inventário de bens deixados no exterior
O primeiro questionamento que vem à tona é sobre o local de abertura de inventário na hipótese em que o falecido deixou bens no exterior. No Brasil é vigente o princípio da territorialidade e pluralidade. Isso significa dizer que o inventário dos bens deixados pelo falecido deverá ser feito no país onde estão situados os bens. Por exemplo, se um brasileiro possui bens em Portugal e vem a falecer, o processo de inventário desses bens deverá ocorrer em Portugal.
Caso o falecido deixe bens no Brasil e em Portugal, deverá abrir dois processos de inventário, um para partilhar os bens que estão no Brasil e outro para partilhar os bens que estão em Portugal. Contudo, como se trata de justiça, nada é tão matemático assim. Há entendimentos jurisprudenciais em Portugal (Tribunal da Relação de Coimbra – 137/09.0YRCBR) no sentido de que a competência para o julgamento do inventário de bens de brasileiros deixados em Portugal é da justiça brasileira, cabendo a justiça de Portugal apenas homologar a sentença brasileira em um processo chamado de revisão de sentença estrangeira.
“Quando a sentença que se pretende rever/confirmar é de habilitação/inventário e nele não só constam como bens a partilhar bens imóveis sitos em Portugal mas também imóveis sitos no Brasil, tendo a partilha havida abarcado todo o acervo hereditário do “de cujus”, afigura-se-nos que o Tribunal brasileiro tem competência para essa habilitação e partilha, sem o que nunca poderia ter lugar uma partilha conjunta dos bens deixados pelo inventariado, como se pretende que seja possível e desejável.”
Há ainda decisões do Superior Tribunal de Justiça do Brasil que reconhece a possibilidade de um Tribunal estrangeiro processar testamento de bens deixados no Brasil, desde que respeitadas as leis brasileiras (STJ, HDE 966, 2017/0247253-4).
Conquanto a homologação confira eficácia executiva à decisão estrangeira, não há óbice para que o juízo em que tramita o inventário do falecido, em cognição plena, decida especificamente sobre os bens situados no Brasil, observando, por exemplo, a existência de bens eventualmente excluídos da partilha, a ordem de vocação hereditária e as questões relativas à jurisdição exclusiva do Poder Judiciário brasileiro, nos termos do art. 23, I a III, do CPC/15
A legislação a ser aplicada pode ser o da residência habitual do falecido, da nacionalidade e até a lei de onde se encontram os bens. É sempre necessária uma análise do caso concreto para se concluir com exatidão qual local deverá ser iniciado e qual regime será submetido o inventário.
Procedimentos e Prazos Inventário em Portugal
Os procedimentos e os prazos do inventário em Portugal são bem diferentes do ordenamento jurídico brasileiro. A título exemplificativo, no Brasil há um prazo de 60 (sessenta) dias para abertura do inventário a partir da data de óbito do falecido. Já em Portugal o prazo para fazer a comunicação do óbito é até o fim do terceiro mês a seguir ao mês em que ocorreu a morte. Contudo, em certos casos (por exemplo, se faltar informação relevante para um determinado bem), este prazo pode ser prorrogado por mais 60 dias.
Procedimentos no Brasil e em Portugal
No Brasil o inventário pode ser aberto por qualquer herdeiro ou cônjuge, ou mesmo àquele que estiver na administração dos bens da pessoa falecida e pode tramitar de forma judicial ou extrajudicial à. A opção pela via extrajudicial é mais célere, contudo, é vedado em alguns casos, tais como a existência de divergência sobre partilha e herdeiros incapazes. Já a via judicial tende a ser menos custosa e mais morosa.
Em ambas hipóteses é obrigatório o recolhimento do ITCMD (imposto sobre transmissão causa mortis e doação) e a porcentagem da partilha para cada herdeiro seguirá o quanto previsto na Lei. Uma vez iniciado o procedimento de inventário extrajudicial, nada impede que as partes desistam (antes da assinatura da escritura por todos) e migrem para o processo judicial. O inverso também é verdadeiro. Os herdeiros necessários (legitimários em Portugal) são os mesmos em ambos os países: descendentes, ascendentes e cônjuge.
A ordem hereditária em Portugal é: cônjuge e descendentes, cônjuge e ascendentes, irmãos e seus descendentes, outros parentes na linha colateral até ao 4.º grau e o Estado. Tal como no Brasil os parentes mais próximos têm prioridade. Ou seja, os pais excluem os avós; os filhos afastam os netos e os parentes de 3.º grau impedem os de 4.º grau de receber algum bem.
Enquanto no Brasil, a legítima (porção de bens de que o testador não pode dispor, por ser legalmente destinada aos herdeiros legitimários/necessários) é de 50%, em Portugal isso depende. Por exemplo, se existir só um filho, a legítima é de metade da herança. Já se existirem dois ou mais filhos, a legítima é de dois terços.
Procedimentos de inventário em Portugal
Antes de dar início à partilha ou inventário em Portugal, o cabeça-de-casal (pessoa responsável pela administração da herança) deve proceder à habilitação de todos os herdeiros, ou seja identificar quem são os herdeiros do falecido. Isso deverá ser feito em um cartório notarial ou Balcão de Heranças, Espaço Óbito ou Plataforma de Atendimento à Distância.
Caso haja mútuo acordo a partilha dos bens será processada em um Cartório Notarial ou ao Balcão de Heranças, (disponível nas Conservatórias). Caso não exista acordo entre os herdeiros ou ainda em caso de incapacidade de um deles, procede-se ao inventário dos bens, que pode tramitar extrajudicialmente (cartório notarial) ou judicialmente (tribunal). É necessário apresentar a certidão de óbito, relação dos bens e habilitação de herdeiros.
O Cartório Notarial competente é o sediado no município do lugar da abertura da sucessão, que corresponde ao lugar do último domicílio do autor da sucessão.
Tributos sobre heranças no Brasil e em Portugal
No Brasil a transmissão de bens em razão do falecimento de um indivíduo está sujeita ao pagamento do ITCMD e a fixação da alíquota desse imposto é de competência dos Estados e do Distrito Federal, podendo variar entre 2% e 8%.
Já os bens recebidos no exterior não são tributados desde 2021, ocasião em que o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a inconstitucionalidade e proibiu a cobrança do imposto pelos Estados e Distritos Federais sem que haja uma lei complementar que a regulamente. Os critérios para que a isenção de ITCMD seja aplicado são os casos em que o doador ou falecido é domiciliado no exterior e os bens estão no exterior ou o inventário é realizado fora do país.
Em Portugal os herdeiros devem pagar o imposto sobre herança, que é o Imposto do Selo fixado em 10% sobre o valor herdado, todavia, encontram-se isentos do imposto sobre herança os herdeiros legitimários (cônjuge, filhos, netos, pais, etc). Portanto, todos os restantes beneficiários – incluindo irmãos do falecido – têm de pagar o imposto sobre herança. Mas atenção, mesmo sendo isentos do pagamento do imposto de herança, os herdeiros devem proceder à declaração às Finanças.